Não é raro encontrarmos algum esforço para diminuir o mérito individual. Muitas pessoas afirmam que a situação atual de suas vidas é fruto da sorte, alegando que o sucesso depende de uma coincidência de fatores que outros não têm acesso, como a participação em um projeto decorrente da criação de um novo centro de pesquisa em uma universidade.
O fato de que a vida não seria a mesma sem todos os eventos que ocorreram fora de nossos domínios pode, de fato, ser visto como sorte em um sentido subjetivo, principalmente para um povo sem esperança de uma vida melhor e acometido por tantas necessidades, mas não como obra do acaso, porque o acaso não existe.
Ou seja, faz sentido a seguinte questão: qual a probabilidade de alguém sair de uma periferia ou de uma cidade pouco desenvolvida e tocar seu próprio negócio, trabalhar em uma grande empresa ou concluir uma graduação com sucesso?
Ser bem-sucedido em algo, de maneira legal, é fruto de fatores como trabalho individual, inclusão econômica (Amartya Sen), investimento público, progresso tecnológico (Edmar Bacha), instituições que funcionam (Douglass North) e uma educação de qualidade. Diante de tantas decisões — como a criação de uma creche que aumenta a produtividade de uma mãe, a criação de centros técnicos para a qualificação de jovens, projetos de financiamento com juros baixos e bolsas para fomento à pesquisa —, alguém pode acreditar que foi apenas sorte.
Chegamos a nos sentir pequenos diante da grande quantidade de eventos que nos cercam, mas o desenvolvimento contingencial não significa que não houve lógica nas decisões tomadas (Daron Acemoglu). Governos, empresas e pessoas fazem escolhas que envolvem investimentos e gastos que impactam diretamente a sociedade.
O progresso, por natureza, transforma a vida das pessoas, especialmente quando, por interesse individual, estão empenhadas em aumentar seu próprio bem-estar (Adam Smith). A sorte não se senta em uma cadeira para fazer uma prova, nem se levanta cedo para trabalhar.
O mérito individual não significa que, sem investimentos importantes no país, as pessoas seriam capazes de fazer tudo sozinhas. No entanto, dado que existem meios e ferramentas adequadas, elas terão a oportunidade de buscar aquilo que desejam ser — ou seja, terão possibilidades de escolha (Amartya Sen).
Quando o governo gasta de maneira ineficiente, não dizemos que é falta de sorte estar em uma situação de difícil acesso à saúde e à educação devido à ineficiência da gestão pública. Então, por que devemos dizer que é sorte quando o governo cumpre o seu papel?
Cada indivíduo busca seu próprio benefício (Adam Smith). Contudo, para que o esforço individual se traduza em ganhos coletivos, é necessário que existam investimentos públicos que potencializem esses esforços, promovendo o crescimento sustentável e o aumento da produtividade (Edmar Bacha). Não se trata de sorte, mas de tomar as decisões certas para que as pessoas não sejam privadas da inclusão econômica.
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